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Prólogo
Como
todo bom escritor (“bom” aqui significando “ordinário”), num arroubo de
presunção certo dia decidi escrever uma biografia. Empreitada fadada ao
insucesso. Não tanto pela falta de perícia quanto pela falta de assunto. Desisti,
obviamente, quando ainda falava das fraldas de pano dos meus tempos de bebê.
Todavia,
a experiência deixou acesa uma pequena chama. A luz tremeluzente desta chispa
está aí, a seguir, sob a forma de um breve resumo que, presumo, enverga as
dimensões proporcionais ao interesse do e no biografado.
Advertência:
esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança comigo é mera coincidência. Eu
juro.
Nasci
numa família. Pois é, desde o começo já estava fadado a ser um cara muito
normal. Minha família também era muito normal. Meus pais eram pessoas normais,
com empregos normais, que faziam sexo normal quase todo mês. E eram tão classe
média que tiveram 2,8 filhos.
Como
não poderia deixar de ser, tive uma infância muito normal, tanto que não há muito
o que falar sobre ela.
Vamos
pular logo para a adolescência.
Minha
primeira experiência sexual foi precoce. Foi com uma vizinha, só que ela não
sabe disso até hoje (eu estava bem escondido). Na verdade, minha iniciação
sexual foi tardia, mas por opção – delas, obviamente.
Virei
adulto. Um adulto... pasmem... muito normal. Primeiro resolvi ser funcionário
público. Depois resolvi casar. Então resolvi ter filhos. Claro que de vez em
quando resolvia tomar uma cervejinha com os amigos. Cinema também, de vez em
quando.
Aí,
um dia, aposentei. Tinha planejado um monte de coisas para fazer depois da
aposentadoria, mas não deu tempo. Morri de infarto. No enterro, choveu e
ventou. Não tinha muita gente, mas nem era tão pouco. A família mandou fazer
uma lápide. Nela, mandaram gravar meu nome, data de nascimento e de passamento em
letras médias, tipo courier, sem
rebusques. Assim, bem normal. Se eu pudesse escolher, teria mandado gravar carpe diem.
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