terça-feira, 21 de setembro de 2010

Língua - possibilidades e limitações para além da gramática tradicional

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Nota introdutória:

Se Ferdinand de Saussure * fundou em bases sólidas os conceitos da linguística moderna como ciência, coube a Noam Chomsky ** revolucioná-los. Pela mudança do foco de análise da estrutura da língua de ‘em si e por si’ (típico do estruturalismo saussuriano) para a sua inserção no domínio da mente - de onde ela rebenta - o mestre americano se contrapõe à visão empírica, mecanicista e comportamental do aprendizado da linguagem. Este é o fundamento do gerativismo, teoria linguistica revolucionária criada, desenvolvida e propugnada por Chomsky.

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Com base na teoria gerativista de Noam Chomsky, pode-se afirmar que a gramática (aqui referida em termos gerais) é um instrumento finito que permite gerar o conjunto infinito das frases bem formadas de uma determinada língua. Naturalmente, arrolar as ilimitadas possibilidades de uma língua num instrumento limitado é inexequível, de maneira que a estrutura mental do falante assume, instintivamente, essa tarefa. A gramática oferece as bases, o fenômeno da fala erige o intrincado arcabouço do edifício linguístico.

A possibilidade transformacional identificada por Chomsky, além de referenciada no caráter inato da linguagem, fundamenta-se também em determinadas propriedades sistematizadas e identificadas pelo estruturalismo de Ferdinand de Saussure (o gerativismo, em vez de contrapô-lo, usa e reformula o antigo modelo). A dupla articulação da linguagem é uma delas.

As unidades linguísticas são articuláveis, isto é, suscetíveis de divisão em unidades menores. Tal articulação ocorre em dois planos: o plano dos morfemas, no qual se articulam as unidades dotadas de sentido, e o plano dos fonemas, unidades vocais menores que os morfemas, desprovidas de sentido. Um número relativamente pequeno de fonemas (algumas dezenas) possibilita uma imensa gama de combinações, donde se terá um número consideravelmente maior de morfemas. Estes, por sua vez, podem se combinar em um número ilimitado de enunciados.

Além do que, de acordo com as dicotomias saussurianas – em especial as relações sintagmáticas e paradigmáticas e os componentes significante e significado do signo linguístico (para maiores informações, ver bibliografia) – a construção dos fatos linguísticos transita por uma vastíssima gama de possibilidades. Para o falante, o universo das combinações possíveis é infinito, embora se submeta a alguns princípios limitantes, além de se referenciar, sob o ponto de vista formal, na já mencionada norma gramatical. Refere-se aqui ao princípio da arbitrariedade, no sentido de que o significante é imotivado em relação ao significado, e ao caráter linear da língua, princípio limitante base das relações sintagmáticas.

Conclui-se que, não obstante a vastidão de elementos e de possibilidades peculiares à língua, naturalmente há importantes limitações de ordem formal ao seu uso. Todavia, tais limitações se impõem propriamente ao fato da comunicação, que não é de modo algum o único objetivo da língua; o indivíduo pode - e deve - se permitir, portanto, certas transgressões, sobretudo no campo da expressão artística, livre e flexível, como se verifica nos versos de João Cabral de Melo Neto:

Catar feijão se limita com escrever:
Joga-se os grãos na água do alguidar
e as palavras na folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
(...)
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a como o risco.

(Versos de ‘Catar feijão’; grifos meus).
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* Ferdinand de Saussure, linguista suíço, autor póstumo do Curso de Linguística Geral, tido como o ‘pai’ da linguística moderna.

** Noam Chomsky, professor de linguística do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e autor de Syntactic Structures.

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Bibliografia

SAUSSURE, Ferdinand. Curso de Linguística Geral. São Paulo: Cultrix, 2006.

FIORIN, José Luiz (organizador). Introdução à Linguística – I. Objetos teóricos. São Paulo: Contexto, 2008.
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